A utopia construindo um horizonte possível para crianças e adolescentes no enfrentamento do racismo

os 35 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente

Autores

DOI:

https://doi.org/10.59927/sig.v14i2.191

Palavras-chave:

Estatuto da Criança e do Adolescente, Racismo estrutural, Adolescências, Psicanálise, Políticas públicas

Resumo

O artigo reflete sobre os 35 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), enfatizando sua importância como marco civilizatório na defesa dos direitos de crianças e adolescentes no Brasil. A partir de uma perspectiva crítica e interdisciplinar, discute os desafios para a efetivação plena do ECA em meio a desigualdades históricas e estruturais, especialmente as marcadas pelo racismo, pela violência e pela exclusão social. Dados recentes revelam a persistência de violações, como mortalidade infantil evitável, violência sexual, trabalho infantil, encarceramento em massa e impactos da necropolítica sobre populações jovens, em especial negras, indígenas e periféricas. Destaca-se ainda a precarização da saúde mental infantojuvenil, a patologização da adolescência e os limites no acesso a políticas públicas integradas. Nesse contexto, propõe o fortalecimento de redes intersetoriais e políticas de proteção integral que considerem a diversidade das infâncias e adolescências, valorizando sua pluralidade e o protagonismo juvenil no presente. A análise também articula a crítica ao racismo estrutural com conceitos da psicanálise e da ética da alteridade, apontando a urgência de práticas antirracistas no campo social, educacional e clínico. O artigo conclui que a consolidação do ECA exige compromisso coletivo e permanente com a vida, a dignidade e os direitos de todas as crianças e adolescentes, em especial os grupos historicamente vulnerabilizados, indicando que a utopia da proteção integral permanece como horizonte ético e político e já está em curso.

Biografia do Autor

Carolina Mousquer Lima, APPOA

Psicóloga, Psicanalista, mestre em Psicologia Social e Institucional (UFRGS), Membro da APPOA e do Instituto APPOA.

Fernanda Dornelles Hoff, Sigmund Freud Associação Psicanalítica

Psicóloga e Psicanalista, Membro pleno da Sigmund Freud Associação Psicanalítica e Membro da Sociedade de Psicologia do RS. 

Gabriela Weber Itaquy, APPOA

Psicóloga, psicanalista, mestre em Psicologia Social e Institucional - UFRGS, doutoranda no PPG Psicologia Social e Institucional -UFRGS, especialista em atendimento clínico ênfase em psicanálise -UFRGS, Associada da APPOA e do Instituto APPOA, Coordenadora da Política de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas da 18a Coordenadoria Regional de Saúde - SES/RS.

Luciane Susin, APPOA

Psicanalista, psicóloga da Equipe Especializada em Saúde da Criança e do Adolescente (EESCA Murialdo), na Secretaria Municipal de Saúde de Porto Alegre. Especialista em Problemas do Desenvolvimento da Infância e Adolescência – Abordagem Interdisciplinar – Centro Lydia Coriat, Porto Alegre. Mestre em Psicologia Social e Institucional (UFRGS). Membro da APPOA e Instituto APPOA.

Marisa Batista Warpechowski, APPOA

Psicóloga, psicanalista, mestre em Psicanálise Clínica e Cultura (UFRGS), doutoranda no PPG Psicologia Social e Institucional (UFRGS), Especialista em transtornos globais do desenvolvimento na infância e Adolescência (Instituto Lydia Coriat – POA), Membro da APPOA e do Instituto APPOA, Coordenadora do CREAS Partenon.

Marta Conte

Psicanalista, Pós-doutora (FIOCRUZ/CLAVES), membro da APPOA e do Instituto APPOA, membro do Conselho Consultivo da Rede Nacional de Redução de Danos e Direitos Humanos (REDUC) e da Associação Brasileira Multidisciplinar de Estudos sobre Drogas (ABRAMD).

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Publicado

01-11-2025

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Em pauta